Em reconhecimento à vida e à obra do professor e cineasta Pedro Nunes, a Assessoria de Comunica e Imprensa (ASCIM), do CCTA, realizou uma entrevista especial, como forma de homenageá-lo no dia em que ele recebe a outorga do Título de Professor Emérito da UFPB.
Na entrevista, Pedro Nunes relembra momentos marcantes na trajetória acadêmica e debate temas pertinentes nas áreas do Jornalismo e do Cinema.
Natural da cidade de Pirapozinho (SP), Pedro Nunes é Pós-doutor em Comunicação em Sistemas Hipermídia pela Universidad Autónoma de Barcelona (2003), e é responsável por grandes contribuições ao ensino universitário no campo da Comunicação dentro da Paraíba e em diálogo com outras universidades brasileiras.
Além da carreira como professor e pesquisador, Pedro Nunes produziu inúmeros obras audiovisuais, como o filme ‘Closes’ (1982) que ganhou repercussão internacional, o vídeo experimental ‘Cortejo de Vida’ (1992) e a série de interprogramas ‘Grafite: Visualidades Urbanas’ (2008), produzida para a TV UFPB.
VIDA E CONTRIBUIÇÕES PARA O JORNALISMO
ASCIM/CCTA: Uma trajetória tão célebre quanto a do senhor teve um ponto de partida. Então, para começar, pode nos contar sobre seus anos iniciais no Jornalismo?
PROFESSOR PEDRO NUNES: O meu ponto de partida, que eu digo que é exatamente o meu berço, foi aqui na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), o meu ingresso em 1978. Ingressei através de vestibular. O curso foi criado no segundo semestre de 1977, eu não tive o dinheiro para fazer inscrição no vestibular, então eu fiz na segunda turma em 1978 e depois acompanhei a primeira. Ainda enquanto estudante, eu pude produzir alguns filmes que foram referência na minha trajetória acadêmica, que são importantes até hoje, um desses filmes é Gadanho, que foi produzido em 1979 em parceria com João de Lima Gomes, com o apoio do Programa Bolsa Arte da UFPB. Tem um outro filme, registro de 1979, que é sobre a greve dos estudantes aqui da UFPB e, também, tem um experimento que eu fiz durante estágio realizado na TV Universitária em Natal (RN), em 1979, e o filme ‘Contrapontos’, que é de 1979/80, que foi exatamente no período que eu terminei a minha graduação em Comunicação Social com direcionamento para o Jornalismo. Esse é o princípio da minha carreira acadêmica. Ou seja, esse é o meu berço de formação, que foi muito importante não só no campo do Audiovisual, mas também para minha carreira futura como pesquisador, porque eu fui bolsista de Iniciação Científica, cheguei a ser contemplado por um programa que chamava ‘Bolsa Arte’ e, ainda enquanto discente, eu pude coordenar uma Oficina de Comunicação responsável, por exemplo, pela edição da Revista Cadernos de Comunicação e Realidade Brasileira e a existência de três grupos de trabalho: Teoria e Pesquisa em Comunicação; Grupo de Cinema e Grupo de Editoração. Então, esse foi ambiente inicial da minha trajetória, com publicações já muito interessantes, realização de mostras de cinema e organização de seminários. Naturalmente, conquistei ao lado de outras pessoas um protagonismo respaldado por docentes como Valdir Castro Oliveira, Albino Rubim, Sebastião Martins e outros. Após terminar o curso de Comunicação com habilitação em Jornalismo, imediatamente eu fui contratado como técnico [da UFPB] e fiquei por aqui até o ano de 1983. Em seguida, fui fazer um mestrado na Universidade Metodista de São Paulo, e nesse novo context, começa um outro momento diferencial no meu processo de formação acadêmica e profissional.
ASCIM/CCTA: Num campo tão amplo e mutável como o da Comunicação, é preciso procurar referências para entendermos melhor o que queremos. Quais foram suas referências, tanto no mercado quanto na própria universidade?
PROFESSOR PEDRO NUNES: Aqui na universidade, nós tivemos referências muito fortes de um quadro de professores interessante, porque o curso de Curso de Comunicação teve essa marca forte inicialmente com a presença de três grupos de docentes: primeiro grupo com uma formação no campo do Jornalismo conjugado com o Audiovisual a exemplo de Linduarte Noronha, foi a nossa grande referência e que atuou como diretor do filme ‘Aruanda’, obra basilar do Cinema Novo. Linduarte foi um grande guia, tinha uma formação em fotojornalismo e atuou com regularidade como crítico cinematográfica no Jornal A União e dirigiu uma verdadeira obra-prima. Eu e outros colegas de turma tivemos o prazer de conviver com Linduarte Noronha, mas ainda nessa referência inicial de formação. Outros professores com experiência de cinema também se destacaram: Paulo Melo, Manuel Clemente (que fez a direção de fotografia do filme País de São Saruê), Lindinalva Rubim, Jomard Muniz de Brito e Pedro Santos. Tínhamos um segundo grupo de docentes mais vinculados ao contexto regional do jornalismo paraibano como Luiz Augusto Crispim, Otinaldo Lorenço, Jório Machado e um terceiro grupo de docentes pesquisadores com uma visão de compreensão de mundo mais ampliada e rebuscada como os docentes Albino Rubim, José Luiz Braga, Fausto Neto, Valdir Castro Oliveira e Sebastião Martins. Lembro que havia um quarto grupo de mulheres que trabalhavam com os fenômenos da comunicação de modo transdisciplinar: Lourdes Bandeira, Eleonora Minicucci, Terezinha Libelu, Carmela Buonfiglio. Para não ser injusto, há outras e outros nomes importantes de docentes que marcaram na minha formação inicial. Sempre conjuguei essa questão da teoria e da prática. A prática pode traduzir-se enquanto aplicação das reflexões teóricas e a teoria enquanto cosmovisão das minhas práticas. Eu continuo sendo um pesquisador persistente sempre conjugando essa complexa relação entre teoria e prática para poder interpretar o mundo além de sua aparência. Reconheço esse meu lastro a partir dessas fontes humanas que marcaram a minha vida.
ASCIM/CCTA: E nessa jornada inicial, quais foram os maiores desafios enfrentados?
PROFESSOR PEDRO NUNES: Olha, os desafios sempre foram diversificados. Origem humilde, pobre e a cor que consta no registro: parda. Minha condição econômica sempre foi um desafio muito forte porque eu não dispunha de dinheiro para comprar livros, então a biblioteca sempre foi um espaço de acesso à informação, de busca de conhecimentos. Então, esse desafio econômico foi muito forte para outras questões relacionadas com a alimentação, vestuário e de ter limitações quanto ao acesso à cultura. No contexto da universidade nos deparamos com novos horizontes, mecanismos de solidariedade, promoção humana e valorização do outro. É impacto de formação e de se ver o mundo com olhos livres e com descortinamentos. Muitas vezes, essas dificuldades se tornam mais maleáveis e nos deparamos com a ampliação de oportunidades. Particularmente, sempre corri atrás do prejuízo, com participações propositivas, dedicação aos estudos e disciplina. De certo modo, procurei fazer a diferença com ética e aditando uma perspectiva colaborativa com meus colegas de trabalho ou de estudos. Enquanto estudante, eu nunca tive uma câmera fotográfica ou uma câmera de vídeo, mas os equipamentos da universidade, ou emprestados, contribuíram para marcar a minha vida de forma diferencial. Uma das cenas mais importantes da minha vida foi quando um professor me chamou juntamente com João de Lima Gomes para que nós pudéssemos escolher alguns livros de sua biblioteca. Aquilo pra mim foi de um encantamento indescritível, fiquei maravilhado com aquela generosidade.
ASCIM/CCTA: Nessa caminhada no Jornalismo, o senhor teve diversas oportunidades de participar de palestras e congressos, tanto como ouvinte quanto palestrante. Como esses momentos contribuíram para sua formação enquanto jornalista?
PROFESSOR PEDRO NUNES: Eu sempre procurei extrair o melhor possível de cada atividade acadêmica que eu participei ao longo da minha caminhada como discente, e depois como educador, na condição de docente-pesquisador. Desde o princípio, eu sabia o que queria e estava ali respaldado por um teste vocacional que fiz no Centro de Educação da UFPB. É estranho, mas esse direcionamento ajustou o meu foco na juventude. Todos os trabalhos desenvolvidos no âmbito da universidade pública foram realizados com esmero, lapidação, ou seja, tijolo por tijolo. Nem tudo está registrado na plataforma Lattes. Foram muitos trabalhos desenvolvidos ao longo da minha vida acadêmica. Não se trata de um autoelogio. Trata-se de imersões participantes, colaborativas, sempre tocando e influenciando outras pessoas. Foram ações muito importantes de ensino, pesquisa, extensão e administração, que eu sempre procurei estabelecer ou imprimir um diferencial. Conjuguei essas situações também em processos formativos de mestrado, doutorado e pós-doutorado, conjugando ações complementares relacionadas com o meu objetivo de pesquisa e o meu trabalho com atuações em outras universidades, centros de pesquisa, bibliotecas, centros, culturais, mostras culturais e outros. Ou seja, sempre transformei as cascas do abacaxi em aloá e essas interações foram marcantes na minha trajetória. Esse nível de interação durante a realização do doutorado na PUC-SP e com estágio doutoral em Barcelona representou o ápice em termos de interlocucões acadêmicas em diálogo com a realização de grandes projetos, interação com a minha produção audiovisual, filmes, vídeos e fotografia. Destaco que eu não não me considero fotógrafo, mas fotografia deu suporte para outros projetos e alguns projetos fotográficos conquistaram patrocínios inusitados em termos de circulação. Em síntese, tanto participei, direcionei o meu trabalho com palestras, seminários, simpósios, realizações audiovisuais, seja atuando como docente na UFAL e na UFAL ou estando em processos formativos de capacitação em outras universidades.
TRABALHO COMO JORNALISTA
ASCIM/CCTA: O senhor já trabalhou em alguma empresa de comunicação ou em algum segmento do mercado jornalístico? Se sim, qual foi sua experiência?
PROFESSOR PEDRO NUNES: Sou um docente-profissional que colaborou no processo de formação de outros profissionais jornalistas. O mercado profissional possui exigências próprias. A rotina profissional do jornalista pode levar à exaustão se ele não interagir de forma diferente. Entendo que trabalhar no mercado é algo que representa um desafio. Direcionamos os futuros profissionais para atuarem com ética, checagem dos acontecimentos e investigação. No princípio da minha carreira, por muito pouco, eu não fiquei atuando na televisão educativa do Rio Grande do Norte. Quando saiu o meu contrato aqui na UFPB, na sequência, saiu um possibilidade de contrato na TV UFRN, decorrente de um estágio de três meses que realizei por vontade própria, com anuência da Direção e sem carta de apresentação. Até hoje, tenho amizades, principalmente da redação da TV Universitária de Natal, da UFRN. Então, ali se apresentou como uma oportunidade de trabalho, e eu desenvolvi um programa que se chamou ‘Experimento’. Também tive uma experiência diária no jornal Correio da Paraíba e, posteriormente, uma experiência jornalística na Folha de São Paulo em 1984, no caderno de informática em que eu assinava uma coluna sobre videoclubes, que falava dos vídeos mais assistidos e produção independente. Nós construímos os espaços de atuação e com habilidade reinventamos a nossa participação nesses espaços previamente designados. Por sugestão do editor-chefe, comecei a assinar com um pseudônimo Pedro Moreno, depois eu mudei para Pedro Nunes porque não gostava do termo ‘moreno’. Foi um tempo bem demarcado enquanto eu estava estudando em São Paulo. É importante salientar que meus filmes e vídeos têm essa marca do Jornalismo muito forte. Fazer um filme ou um vídeo demanda muito trabalho, equipe e recursos financeiros. Então, as práticas do Jornalismo e do mercado de trabalho estão também presentes no meu trabalho Audiovisual e em livros, a exemplo da coletânea ‘Rotinas do Jornalismo no Cinema’.
ASCIM/CCTA: A carreira do senhor também é marcada por diversas produções audiovisuais. Quando surgiu esse interesse?
PROFESSOR PEDRO NUNES: Sim. Desde que ingressei no curso de Comunicação, como já disse, os professores foram determinantes para a construção desse caminho voltado para o audiovisual. Às vezes, os discentes não valorizam os seus docentes. Quando saem do curso é que vão enxergar a importância ou o quilate daquela profissional que exerce a docência. Então, esses mestres já citados me impulsionaram. Foi na UFPB que eu pude fazer cinema. Foi aqui no curso de Comunicação, na Oficina de Comunicação e no Núcleo de Documentação Cinematográfica que eu tive o suporte necessário, com limitações, para fazer filmes ou brincar seriamente com o cinema. Logo no segundo ano, eu já tinha três filmes prontos. Filmes marcantes, que ainda lotam salas na atualidade, a exemplo de ‘Closes’, que circulou pelo Brasil, alguns países da América Latina, Europa e lotou vários espaços nos Estados Unidos. Quer dizer, o tema abordado continua sendo impactante e irreverente. Ali, naquele filmezinho que despertou a ira da censura federal, há essa marca de Jornalismo. Ou seja, no conjunto são filmes de vídeos atemporais, e que a marca de Jornalismo investigativo está presente. Ao todo são dezoito curtas, médias e longas, mas não se trata de numerais, a quantidade serve como um espelho de referência com traços de qualidade.
ASCIM/CCTA: Filmes e documentários, mesmo com as particularidades da própria linguagem, conversam bastante com o método jornalístico de contar histórias. Gostaríamos de saber como o senhor alinhou essas duas esferas em suas produções?
PROFESSOR PEDRO NUNES: Por exemplo, o curso de Cinema e Audiovisual, hoje em dia, é um campo autônomo, mas decorre, digamos, da conjunção de uma grande área: Artes, Comunicação e Tecnologia. O Cinema e o Audiovisual estavam inseridos no campo da “Comunicação de Massa”, entre aspas mesmo, ou indústria cultural. Então, o cinema quadrinhos, a fotografia, a televisão… estavam ali inseridos nesse campo da indústria da comunicação, que hoje em dia já desmaterializou e está em um outro segmento dos sistemas digitais. Estudava-se o Cinema e o Audiovisual junto com Comunicação, com o Rádio e TV. Tínhamos a formação de um profissional com uma formação mais abrangente. O curso de Cinema e Audiovisual foi criado com a minha geração do Super-8. Vários docentes contribuíram para esse processo de criação, mas digamos assim, eu liderei a criação, em termos de organização e fundamentação da proposta por solicitação do então Diretor de Centro, o professor David Campos. São várias instâncias interagindo nesse processo de criação que precisavam de um maquinista para estabelecer cotejos e estruturar o projeto. Então, nós temos a criação de um curso de Comunicação de modo tardio aqui, na Paraíba, em 1977. Os profissionais egressos redirecionam o jornalismo paraibano ou vão atuar em outras esferas. Então, veja, com a minha formação, contribuí para formações em universidades distintas, colaborei com a criação de cursos de graduação e pós-graduação, empreendi projetos de extensão e de pesquisa sempre com esse foco em trânsito: jornalismo, cinema e audiovisual. E nesses cursos específicos, você vai trabalhar também de forma transdisciplinar, com outros campos do conhecimento, outros saberes, que mobilizam. A minha produção audiovisual tem uma marca do Jornalismo num processo de construção narrativa. Meus trabalhos têm uma marca documental, algo que é da investigação, da exploração, do escavamento, e isso é algo que também vem do Jornalismo. Tomo como exemplo o cineasta paraibano Vladimir de Carvalho, que foi um jornalista que resolveu fazer cinema. Hoje em dia, você tem um geração atual que faz cinema, que produz filmes e vídeos, mas antes não dispunhamos de cursos de Cinema e Audiovisual, a não ser nas grandes metrópoles. Então,carrego no meu processo formativo essas misturas, hibridismo e conjunção teoria e prática.
ASCIM/CCTA: Sabemos que, embora o cenário local conte com muitas produções incríveis, ainda representa desafios. Como o senhor definiria os momentos em que produziu filmes e vídeos?
PROFESSOR PEDRO NUNES: No princípio, toda a minha geração produziu filmes com dificuldades. Ainda não dispomos de uma sólida infraestrutura de produção Audiovisual na Paraíba. Eu disponho de um modo próprio de trabalho, de organização, e opero muito de forma colaborativa, ou seja em equipe. O cinema é um trabalho que mobiliza uma equipe e recursos econômicos. Requer uma assinatura, ou seja, é trabalho complexo. Você pode ter projetos amadores que se destaquem e ganhem relevo, ou você pode ter também trabalhos bem elaborados profissionalmente e que não ganhem relevo. O determinante econômico rege todo contexto de um trabalho profissional. Há dependência ou necessidade de políticas de incentivo ao audiovisual e de editais específicos. A Paraíba e o Nordeste têm se destacado. No caso específico de meus filmes e vídeos, que são expressões de um tempo. Possuem essa dimensão colaborativa, intensa, focada, disciplinada, para poder finalizar determinado trabalho. E nada me tirou o prumo, porque se você for uma pessoa desorganizada, não consegue finalizar o trabalho. Por simples que seja uma produção audiovisual, ela sempre será complexa, dependerá de equipamentos técnicos, suporte de produção, logística e outros aspectos que precisam ser levados em conta.
ENSINO DO JORNALISMO
ASCIM/CCTA: A área da Comunicação fornece muitas possibilidades, incluindo a docência. O senhor sempre se imaginou chegando tão longe como professor universitário?
PROFESSOR PEDRO NUNES: A docência é uma profissão relacionada ao seu campo de atuação e de investigação. A minha experiência de atuação no mercado de trabalho jornalístico foi de poucos anos, então eu disponho de um processo de formação que me direcionou desde cedo para a docência e a investigação, que também é um mercado de trabalho. É um espaço de trabalho que você dispõe de maior liberdade. Liberdade até no sentido de operar com escolhas e consolidar essas escolhas. Desde o princípio, eu foquei no meu trabalho de docência que conjuga práticas e processos de ensino, pesquisa e extensão. Sempre fui um docente empenhado e compromissado a construção de uma universidade participativa, democrática e com qualidade. Sempre fugi dos chavões. Exercitei esse tripé (ensino, pesquisa e extensão) com intensidade e qualidade e imersão. Tive respostas do meu trabalho sempre estabelecendo contatos com outras universidades e procurando estabelecer um diferencial em sala de aula, criar novos laboratórios com projetos para melhoria desses laboratórios, sempre mobilizando os discentes no processo de formação. Claro, compus com um grupo de professores. Liderei equipes de Iniciação Científica com outros docentes. Toda pós-graduação requer um trabalho de pesquisa sólido de cada docente então, eu trilhei esse caminho sempre articulando ensino, pesquisa e extensão. Quando estive em situação de administração, fiz o meu trabalho também diferencial, mobilizando equipes e objetivando a qualidade do ensino, melhores condições de trabalho, a ética…[...] Esse Centro, por exemplo, é resultado de um esforço coletivo com lideranças específicas e trabalhos de um grupo que culminaram com o que hoje é o CCTA-UFPB . A Universidade é constituída pelo esforço coletivo dessas micro-histórias.
ASCIM/CCTA: Como o senhor passou a enxergar a academia depois de se tornar professor?
PROFESSOR PEDRO NUNES: Sempre enxerguei a universidade enquanto um espaço vivo, dinâmico e democrático. Nós é que fazemos a Universidade e transformamos a sua estrutura enquanto um bem público. Eu sempre tive a compreensão de que a Universidade, enquanto um templo do conhecimento e o lugar de formação profissional, precisa ser reinventada a cada dia. Aqui, produzimos ciência, operamos com inovações tecnológicas, formamos profissionais que irão inter-atuar em um locus específico. As Universidades brasileiras interferem em contextos regionais, dialogam com segmentos da sociedade, promovem a inserção social. Essa é a minha visão de universidade, que contempla a dimensão participativa e estabelece diálogos com outros centros de pesquisa. Eu me tornei professor muito jovem. Na universidade, procurei estabelecer interlocucões com a iniciativa privada que se nutre desses profissionais egressos dos diferentes centros de ensino. As universidades dependem de verbas públicas para edificação do seu traço diferencial.
ASCIM/CCTA: Enquanto professor, podemos dizer que seu trabalho foi responsável pelas novas gerações de muitos jornalistas na Paraíba. Particularmente, como o senhor se sente ao ver o surgimento desses novos profissionais que um dia foram seus (suas) alunos (as)?
PROFESSOR PEDRO NUNES: Sim, eu contribuí para esse processo de formação de profissionais juntamente com outros professores. Há várias formas de se colaborar nesse processo de formação via sala de aula (ensino) com projetos de extensão, atuações em laboratórios, orientações, monitorias, iniciação científica e outros. O docente deve ser uma liderança constante que atualiza os seus conhecimentos e tem que se preparar para o desafio da sala de aula. Muitas vezes, um projeto de extensão pode ser transformado em um trabalho final de curso, uma atividade de sala de aula pode ser transformado em trabalho de pesquisa e assim por diante. Trabalhei com projetos duradouros de extensão, a exemplo da proposta de extensão comunitária ‘Presença da UFAL em Penedinho’ e do projeto de pesquisa ‘Projeto Multireferencial’. Os projetos de longa duração capacitam e habilitam discentes de forma distinta, tanto do ponto de vista de formação profissional exemplar, atuar na imprensa ou exercer atribuições como futuro pesquisador ou atuações na docência.
ASCIM/CCTA: Como o senhor compara o ensino do Jornalismo até a década de 90 e o ensino de hoje com todas as ferramentas tecnológicas que estão disponíveis?
PROFESSOR PEDRO NUNES: A tecnologia e as ferramentas digitais são instrumentos que te possibilitam construir narrativas em diferentes códigos ou formatos. Essas tecnologias não fazem por você. O importante é que se faça o uso crítico e criativo dessas tecnologias e ferramentas. Quando faleceu Cacá Diegues, eu fiz várias perguntas para a Inteligência Artificial. A ferramenta não me respondeu com precisão. Errou. Pediu desculpas porque apresentei novos dados. Então, há potenciais programados e possibilidades que podem ser explorados pela inteligência humana. Estamos diante de novas descobertas e de novos modelos de produção jornalística, mais líquidos, rarefeitos. Essas ferramentas tecnológicas nos auxiliam, são próteses. Erram mas, também, nos surpreendem. As tecnologias digitais redimensionam tudo, esses livros todos aqui [edições físicas do trabalho do professor] possuem maior reverberação em espaços digitais. Ou seja, vivenciamos a reconfiguração de paradigmas quanto ao modo de produção, circulação e acesso livre tenha melhor visibilidade. Temos que operar com uso e as possibilidades criativo dessas tecnologias, ou seja, subverter o potencial programado das máquinas, porque isso aqui [celular] é uma máquina que tem a sua capacidade, você é quem vai dizer o ângulo, o enquadramento, a relação, você vai imprimir significado de sua forma de olhar. Então, o que o ensino Jornalismo precisa estar atento a essas transformações do conhecimento que implicam em mudanças das tecnologiaa. O avanço tecnológico é fruto dos avanços da ciência. Do ponto da docência, os professores têm que continuamente estar imersões nesse processo de atualização do conhecimento e manejo crítico das tecnologias.
ASCIM/CCTA: Como professor, o senhor contribui para a formação de comunicadores. O que podemos esperar dessas próximas gerações de jornalistas diante de tantos desafios como a desinformação, por exemplo?
PROFESSOR PEDRO NUNES: As novas gerações dispõem de potencial para remodelar o Jornalismo. Tal qual as universidades, o jornalismo também necessita ser reinventado. Reinvenção não se reduz ao diletantismo. É importante assinalar que você não pode reinventar a roda. Você tem que dispor de princípios éticos que encampem a dimensão estética, por exemplo. Ter como referência grandes autores, obras importantes que lhes sirvam como referência. Para se redirecionar os caminhos do Jornalismo, fazem-se necessários todos esses cuidados quanto a checagem de informações. Jornalismo não se conjuga com a desinformação, com as notícias falsas e com corporações que disseminam informações mentirossa. Esse é o jornalismo de esgoto que as escolas de jornalismo não emsinam, praticam ou defendem. Cabe a essa geração também fazer o seu próprio diferencial, porque o Brasil é como um continente, e você tem tantas coisas para apresentar de forma séria, humana, real, e comprometida, a exemplo dos povos indígenas, comunidades quilombolas, movimentos sociais urbanos, conflitos de terra e outros. A nova geração deve cavar o seu espaço para trabalhar com dignidade e fazer um Jornalismo diferencial. É não se entregar ao habitual Jornalismo comprometido com as corporações, do poder econômico, poder político, e que com as suas honrosas exceções, fazem um Jornalismo medíocre. Entendo que as novas gerações têm esse papel de reinventar o jornalismo, sem apagar as referências significantes. A forma de interagir com Jornalismo precisa ser mais colaborativa, de forma mais flexível e práticas cada vez mais horizontais. É importante que esse novo modelo de Jornalismo não reproduza modelos dominantes.
ASCIM/CCTA: Graças às suas produções, o senhor conseguiu ter contato com várias pessoas do Brasil e de outros países. O que o senhor viu de diferente e de semelhante no modo com que esses outros pesquisadores pensam o Jornalismo?
PROFESSOR PEDRO NUNES: Quando você faz pesquisa, você está desenvolvendo algo singular. O maior avanço da ciência é quando se constata um erro ou quando você apresenta resultado com um modo de interpretação diferente. Então, quando você é um pesquisador, onde você chegar, esse seu trabalho vai ter um reconhecimento, desde que siga princípios metodológicos, que disponha de fundamentação teórica, que maneje com conceitos, autores e apresente e comprovações. O que acontece é que, em outros países, você tem um ambiente propício para o desenvolvimento da pesquisa, ou seja, há valorização do trabalho do pesquisador. Essa valorização também ocorre em outros campos, em outros segmentos, com finaciamentos. O Brasil tem um destaque, mas requer ampliação de financiamentos. Na esfera da ciência, também há corporações, monopólios, oligopólios. Mas não se preocupe, porque quem faz ciência aqui no Brasil dispõe de reconhecimento, só que lá no exterior, você tem um ambiente propício, tem inteligência, dispõe acesso à informação, acesso ao conhecimento e condições de trabalho, totalmente diferenciais dos nossos. Nós temos que quebrar essas barreiras internas para ampliar o nosso salto para um patamar mais elevado quanto à produção científica.
TÍTULO DE PROFESSOR EMÉRITO DA UFPB
ASCIM/CCTA: Para encerrar, gostaríamos de saber como o senhor pode definir esse momento de reconhecimento em sua carreira com a outorga do título de Professor Emérito concedido pela UFPB.
PROFESSOR PEDRO NUNES: Eu considero esse momento de extrema importância para minha pessoa, em termos de reconhecimento da minha caminhada acadêmica. A homenagem reconhece o meu trabalho distintivo tanto na UFPB como na UFAL. Trata-se de uma caminhada que possui vários afluentes, do ponto de vista de interações com pesquisadores, os alunos, as universidades brasileiras e estrangeiras e leva em conta os aprendizados dinâmicos etc. Credito essa homenagem, essa minha caminhada, à Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e à Universidade Federal de Alagoas (UFAL). A UFPB foi a universidade que me deu mais condições, ou melhores condições, para que eu pudesse trabalhar, produzir e desenvolver projetos, mesmo com todas as dificuldades. Na UFAL, eu tive uma contribuição muito forte no campo do ensino e da extensão. Na UFPB, eu reingressei em um período de minha maturidade e pude colaborar com a criação de programas de pós-graduação, cursos de graduação, implementação de laboratórios etc. Com o reconhecimento de toda essa dinâmica de trabalho, o título de Professor Emérito torna-se importante e marcante em minha vida.
Principais Premiações recebidas pelo professor Pedro Nunes:
Prêmio Graciliano Ramos (1996 – UFAL)
Prêmio Honra ao Mérito Assembleia Legislativa da Paraíba (2013)
Prêmio Academia Paraibana de Cinema | Cinema & Memória
Finalista do Prêmio Nacional INTERCOM
Prêmio Maturidade Acadêmica (INTERCOM 2022)
Confira os principais trabalhos acadêmicos do professor Pedro Nunes!
Pedro Nunes Filho | Produção Acadêmica | Livros, Filmes, Vídeos e Projetos |
https://pedronunesfilho.wordpress.com/
Mestre da UTOPIA: fragmentos de caminhada polifônica | Org. Elton Bruno (UnB) |
https://mestredautopia.wordpress.com/
Pesquisadores e pesquisadoras destacam e analisam as vivências acadêmicas compartilhadas com o Professor Pedro Nunes
Redação: Esther Sousa (bolsista da Extensão do CCTA)
Edição: Débora Freire (jornalista no CCTA)
Fotos: Afra de Medeiros
Data da publicação: 07/04/25